The nearness of you.

E, de vez em quando apetece, por um momento, por cinco minutos do dia, ser solteira de novo. Ter a liberdade de dizer, de fazer, de gritar as coisas que são politicamente incorretas de fazer quando estamos numa relação com alguém. São aqueles cinco minutos liberalistas que precisamos ter no nosso dia, para saber, depois deles passarem, que nada bate a outra pessoa. Oh! Nada bate aquela mensagem, antes de adormecer, com a promessa de um bom dia, na manhã seguinte, recheada pela promessa de uma vida inteira de “Bons dias” ensonados, com sabor a mel. Nada bate esse acordar. Nenhum flirt, nenhum fling, nenhuma conquista de uma noite, bate aqueles amanheceres tardios, em que ambos os olhares embevecidos de sono e paixão, se perdem na imensidão da luz. Aquele toque, tão certeiro como se tivesse nascido connosco. Aquela pele que é, ao fim ao cabo, a nossa pele.

Não há nada que chegue ao que é partilhar a vida com a pessoa que sabemos que vai estar lá durante muito tempo. Nada como acordar de manhã com vontade de ficar. De ficar o dia todo. Sem nada de especial que nos faça ficar. Só ficar, porque com aquela pessoa, ficar é bom. Aliás, ficar é ser.

E não falo apenas daquela excitação do primeiro mês, das primeiras semanas, ou um bocadinho mais além. Falo do querer ficar, quando já estamos há muito tempo. Do bom que é aquela rotina, do bom que é aquele beijo que já conheces, mas que te surpreende. E, mesmo sabendo que a mão vai passar pela coxa, ou pelas costas, continua o friozinho na barriga,  Continua o arrepio, as borboletas. Ouve-se ao fundo Etta James, e pensa-se “não quero sair daqui”. E, naqueles momentos, com aquela suavidade, os cinco minutos acima referidos são pó. O que são esses cinco minutos, num ano, numa década, numa vida? São necessários. São. Necessários para sabermos que não há nada melhor do que o cheiro do familiar. O amor é mais amor, o sexo é mais sexo, as discussões são mais discussões. Tudo é mais de si mesmo, quanto nós somos mais de nós mesmos. E não há melhor forma de sermos nós mesmos, sem medo da outra pessoa. Porque, mesmo nunca conhecendo ninguém a cem por cento, ao fim de um tempo, sabemos que podemos ser aquilo que somos. Pode irritar: e irrita. Pode custar: e custa. Mas tudo na vida tem um custo.

Eu, pessoalmente, não me importo nada desse custo. Acho tão belo quando duas pessoas se gostam. E ainda é novo para mim. Já tem doze meses, e ainda é novo. Esta coisa meio alien de partilhar-me com alguém. De ceder-me, num todo e em partes, só para ele. Esta coisa de saber que ele sabe tudo o que eu levei anos a camuflar. É estranho, mas é bom. Aquelas mãos conhecem-me quase tão bem como eu mesma. Aqueles lábios têm gosto de Cláudia. E que importa, se já provaram as demais. Isso costumava incomodar-me. E minto se disser que me é completamente indiferente. Mas tem de existir a prova, para se saber o gostoso. O mais gostoso, o saboroso. Há muitos morangos, há muita cereja, há muita fruta. E depois há a fruta boa.

Com tanto no coração e com mais nada na mente, retiro-me, confortada com Ella Fitzgerald & Louis Armstrong a tocar-me ao de leve. Suavemente, a música rodeia os meus sentidos. Smooth. E, nada melhor que Stanley Kubrick para acabar a noite. Música e Filmes. Um café e um amor. E morria feliz.

 

 

Kiss kiss, Cláudia.

 

 

https://www.youtube.com/watch?v=uEb4HzgILUU (Ella Fitzgerald & Louis Armstrong – Ella & Louis)